segunda-feira, 20 de maio de 2013

N.

A N. foi assim a modos que herdada da minha mãe. Conheço-a há tanto tempo que até tenho dificuldade em contabiliza-lo. Baixa, coesa e sem papas na língua. Trata-nos a todos por “meninos” e “meninas” pouco importando que, no meu caso, até seja mais velho do que ela.

Excelente cozinheira está sempre a “cramar” de quando o detesta fazer. Corta, fatia, esmaga, tempera, apura os alimentos com um desprezo absoluto. E quando lhe fazemos o elogio da mão apurada encolhe os ombros com desdém.

O mundo de N. é a preto e branco permitindo aqui e ali umas nuances de cinzentos pouco coloridos. As coisas são o que são e a mais não são obrigadas. Se lhe falamos de políticos recebemos um sonoro: “são todos uns filhos da puta!”. Se lhe falamos de futebol o seu discurso torna-se irritado e desanca nos clubes do marido que o levam a fazer figuras que não aceita e a servir-se deles como desculpa para um copo a mais com que chega a casa ao fim de semana.

Com cerca de um metro e sessenta não posso esperar dela qualquer tido de arrumação acima dessa altura. O mundo só é mundo até aos 160cm daí para cima “its the twilight zone”. A minha casa é imaculada até ao meu peito e eu habituei-me a gostar dela assim…

Mulher decidida e mandona. Nada desperdiça e tudo se aproveita. Saca de um martelo e prende-me as cortinas da sala como se carpinteiro fosse, acerta-me o pingo da torneira da casa de banho e se me apanha distraído carrega caixas e caixotes como um estivador à moda antiga.

Ciente dos seus direitos às vezes, como boa portuguesa que é, “esquece-se” dos seus deveres. Mas não o faz por maldade. Se os outros, os mais poderosos, o fazem, ela não quer ser de menos do que eles.

Quando os senhores da política quiserem ouvir “a sociedade civil”, seja lá isso o que for, podem passar cá por casa que não darão o seu tempo por perdido.