sexta-feira, 11 de outubro de 2013

IN DIÁRIO NOTICIAS/MADEIRA - 11 OUTUBRO 2013

O Rei...

Havia um rei que tinha um prazer muito especial em se ouvir. Falava coisas muito faláveis que enchiam os ouvidos de uns quantos que com aquilo se deliciavam. 
Os seus discursos eram de boca cheia e na sua secretária moravam canetas de muitas cores e folhas de papel pardo onde escrevia desalmadamente tudo o que lhe vinha à cabeça. Secretários expeditos liam-lhe em voz alta os escritos e o Rei abanava a cabeça de contente com a qualidade da verborreia.
Mas eram tantos os seus escritos que ao Rei já não lhe ocorria nada de novo. Precisava de novos discursos, de novas ideias pequenas que pudesse desenvolver à exaustão. 
Daqueles que há sua volta andavam em bicos de pés destacava-se um que também gostava muito de se ouvir. Não tinha muito jeito para a coisa do falar e do escrever. Mas como falava grosso e alto tinha-se em muito boa conta.
Não tardou muito que esta personagem a todos se apresentasse como um verdadeiro especialista em “falas mágicas”! 
O Rei, que era pessoa viajada, já tinha ouvido falar de muita coisa, mas de “falas mágicas” nunca. Ficou curioso e mandou chamar “o da voz grossa”.
- Fale-me então dessas “falas mágicas”…
- Ah, meu Rei… - disse “o da voz grossa” – estas falas são muito especiais… só as pessoas inteligentes conseguem ouvi-las e lê-las!
O Rei ficou encantado e contratou-o imediatamente. Alojou-o num amplo aposento onde poderia escrever as “falas mágicas” que só os inteligentes poderiam ouvir e ler.
Passaram-se uns dias e o Rei mandou chamar o seu secretário. Mandou-o ir ao amplo aposento saber das escritas inteligentes do “da voz grossa”. E assim fez a figurinha.
Ao encontrar-se com o “da voz grossa” logo lhe exigiu ver o escrito. Foi lhe então apresentada uma folha de papel em branco.
- Veja a beleza deste escrito… As figuras de estilo, a elegância do fraseado… uma verborreia do mais alto gabarito digna somente dos mais inteligentes!
O secretário não conseguia ver uma única letra na folha em branco. “Se não vejo o escrito é porque sou estúpido” – pensou. Resolveu então fazer-se de inteligente.
- Mas que belo discurso. Do melhor em que pus a vista em cima… - disse. 
E voltou a trote para junto do Rei para lhe dar conta do concluído.
Até que chegou o dia em que o Rei mandou chamar o “da voz grossa” para que este lhe desse o discurso pois precisava de falar numa inauguração da décima parte da obra de uma circunvalação. 
Ao entregar o discurso o “da voz grossa” disse:
- Veja V. Majestade a beleza deste escrito… As figuras de estilo, a elegância do fraseado… uma verborreia do mais alto gabarito digna somente dos mais inteligentes!
O Rei, porque também ele não quis passar por estúpido, dirigiu-se apressadamente para a inauguração e começou a discursar. Só que desta vez movia a boca e não se ouvia uma palavra… não se ouvia um único som!
No alto de uma árvore estava uma criança que a tudo assistia. E na sua inocência, e no meio do sepulcral silêncio, logo diz:
- O Rei mexe a boca mas não diz nada!
O Rei pára os modilhos que fazia e o silêncio torna-se ainda maior!
De repente começam todos a rir e a gritar:
- O Rei não diz nada que se entenda… o Rei não diz nada que se entenda…
E o Rei saiu pela porta pequena do Palácio. 
E os ratos pela porta grande…

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