sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Lendo (I)

O Palácio Nacional de Mafra assinala sábado com um colóquio os 25 anos do livro «Memorial do Convento», no dia em que passam 290 anos desde o lançamento da primeira pedra do monumento. – Diário Digital/Lusa, 07.11.15

Interessante a notícia. Duas realidades que muito me marcaram. Mafra, onde cumpri parte do meu serviço militar e “Memorial do Convento”, para mim, o melhor livro de Saramago.

Mafra trouxe-me memórias. Algumas quase que esquecidas. Jovenzito de 21 anos a franquear as portadas enormes do Convento, ou “Calhau” como lhe chamávamos, receoso, largado da família num mundo novo, cruel, brutal e estupidificante. Nunca hei-de esquecer o tratamento dado a um objector de consciência que se encontrava à minha frente. Ainda bem que hoje só vai quem quer para essa inutilidade chamada Forças Armadas.

Mas nem tudo foi mau. Perduram ainda amizades feitas na altura.

Saramago. Com Saramago tenho uma relação de amor/ódio. Amor pelo que escreve e ódio por muitas das posições políticas que assume.

“Memorial do Convento”. De início de muito difícil leitura é um prazer que se aprende a gostar. Saramago tem a enorme habilidade de nos transpor para a época. Tudo aquilo é visualmente credível e imaginável. Tão imaginável que por vezes nos embrenhamos na teia urdida pelo escritor de tal modo que a abstracção é total.

Baltazar e Blimunda. Personagens de carne e osso, palpáveis. Ele perdeu a mão esquerda na guerra e ela tem o misterioso poder de ver para além das pessoas, o que está por debaixo da pele. Baltazar é também conhecido por Sete Sóis e Blimunda, mais tarde na trama, passa a conhecida por Sete Luas. Está escrito que onde houver um sol tem que haver uma lua. E é por causa do amor entre os dois que é possível a terra ser habitada.

Bartolomeu de Gusmão e a Passarola Voadora. É o sonho, a imaginação sem limites ao serviço da ciência e do progresso. O Jesuíta construiu uma máquina que voa usando como combustível a vontade humana. E não é senão essa vontade que nos trouxe até aqui, com todos os problemas e vantagens que é a vida do ser humano em pleno século XXI.

E juntam-se assim três sonhadores em pleno séc. XVIII num país supersticioso iluminado pelas fogueiras da Inquisição e governado por um rei megalómano que não sabe o que fazer ao ouro do Brasil. E tanto havia o que fazer.

E por aqui me fico cheio de vontade de reler este “Memorial...”, sem dúvida um dos mais belos e empolgantes livros da literatura portuguesa.

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