quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Pistas Para Uma Nova Cultura (I)

A inauguração de um novo milénio, depois de mais de 30 anos de Autonomia, coincide com muitas e significativas alterações políticas e sociais no todo mundial. Tudo parece indicar, pois, que o balanço a fazer dos últimos anos de modo a clarificar a situação actual da cultura madeirense não pode separar-se das perspectivas de mudança que se adivinham no horizonte.

Mas ainda que se torne evidente que se produziram esforços valiosos e sacrifícios exemplares, por vezes materializados em experiências não conseguidas e avanços parciais, o repto que se nos depara como madeirenses e como europeus nos alvores deste novo século, não permite que continuemos a usar profiláxias de fuga e de não assunção de responsabilidades. E isto é assim, porque, no conjunto da nossa cultura é facilmente verificável:

* politicamente – a falta de vontade transformacional;

* socialmente – a inexistência de uma consciência e de um verdadeiro espírito regionalista;

* éticamente – falta de honestidade moral;

* técnicamente – falhas profundas ao nível estético e criativo.

São estas as falhas que nos levam a uma cultura descaracterizada, desmoralizada, com falta de estima e amor-próprio, desconhecida da maioria e numa situação de quase pré-desespero.

A responsabilidade da sociedade, dos políticos e dos agentes culturais é sem dúvida repartida, mas enquanto a primeira é um conceito abstracto ao qual não se podem atribuir nomes ou apelidos, os dois últimos sectores são pessoas concretas sobre as quais pesam responsabilidades e protagonismos. Nos bons e maus momentos.

Os critérios de apreciação subjectiva de actuação (ou a falta deles) não são os únicos que explicam a ineficácia cultural, onde muitas vezes se produz com óbvia carência de preparação adequada.

Mas se à classe política se podem atribuir responsabilidades pelo marasmo cultural em que vivemos, a suposta intelectualidade que trabalha ou pelo menos vincula o seu nome à cultura madeirense não está também isenta de grandes responsabilidades. A prova disso é a generalizada impressão de que só pretendem adquirir mesquinha notoriedade pública, esquecendo o espírito crítico e imaginação criadora que devem caracterizar uma cultura que se quer viva, avançada e livre.

Devemos reivindicar uma ambição profunda para os nossos intelectuais e recusar a vaidade ridícula e a mesquinhez materialista, que só conduz ao atrofiamento criativo e à corrupção venal.

É urgente o arranque, um arranque sustentado nos valores regionais e autonomistas que nos tornam diferentes. Temos que superar a inconsistência teórica, a ineficácia técnica, o atrazo procedimental e a superficialidade crítica, incorporando e aprendendo o que o mundo nos sugere, numa leitura autonomista e intrinsecamente madeirense. Incorporar o bom, venha ele de onde vier, agarrar as mais actualizadas inovações, sem renunciar à possibilidade de uma elaboração própria, original em todos os aspectos.

Tudo isto são tarefas enormes que cabem não só à vontade política, mas também ao todo social, ao rigor ético e intelectual e a uma imaginação sem fim própria de um povo que só pode emergir como tal se a sua cultura for uma realidade. Temos pois que trabalhar com sentido de responsabilidade e com paixão criativa.

Ou isto, ou nada.

2 comentários:

MMV disse...

Em casa e nas escolas nunca fomos ensinados a saborear a cultura...

Nuno Morna disse...

Se queremos a afirmação da nossa identidade como povo é muito importante que se comece a pensar a cultura como a mais importante característica identificadora.
Um abraço

ps: como é que está o tempo na Irlanda?